
Outro dia, assisti a um desenho animado mais do que diferente,Kiriku e a feiticeira, de Michel Ocelot. O filme começa com uma mulher, africana, grávida. Dentro do ventre materno, o bebê fala: "Mamãe, eu quero nascer." A mãe responde que, se ele já fala dentro da barriga dela, pode nascer sozinho. O menino engatinha para fora do corpo da mãe e corta o próprio cordão umbilical. "Mamãe, você tem que me lavar." Se ele nasceu sozinho, também pode se lavar sozinhom, é o que a mãe responde. Ela recomenda apenas que economize a água, porque, desde que a feiticeira Karaba apareceu na aldeia, o riacho parou de correr e todos os homens que vão combatê-la são comidos, inclusive o pai e o tio de Kiriku. E Kiriku, apesar do preconceito que sofre por ser menor que todos, vai atrás de Karaba para acabar com o sofrimento do seu povo.
A animação, com desenho algo naïf, é infantil mas não infantilizada (as cores são fortes - "tropicais?" - e as mulheres andam com seios à mostra, o que levou o filme a receber indicação "adulto" nos EUA). Uma análise do filme pode ser encontrada aqui.
A história é baseada em lendas da África Ocidental, e o interessante é notar como o tom se parece com as narrativas indígenas que inspiraram Macunaíma, de Mário de Andrade. Folheando hoje um livro do Sérgio Buarque de Holanda, O espírito e a letra, encontrei "O mito de Macunaíma". O antropólogo, historiador, crítico, etc., etc. Macunaíma e Piá, gêmeos filhos do Sol, ainda no ventre da mãe, dizem: "Saiamos a visitar nosso pai. Mostraremos o caminho..." No meio do caminho para encontrar o pai de Piá e Macunaíma, a mãe acaba caindo e se machucando. Enfurecidos, os gêmeos se recusam a indicar a direção novamente. A mãe é morta por um jaguar, mas as crianças sobrevivem e crescem rapidamente. Dentro de um mês já eram adultos.
Outra semelhança entre os dois mitos está nos "suporpoderes" de Kiriku (que, além de já nascer espertérrimo, corre mais rápido que qualquer um) e do "deus" Macunaíma.
Queria ter mais tempo - e conhecimento - para tentar entender o que, afinal, significa esse mito do filho conversar com a mãe antes de nascer. Seria uma referência à óbvia e profunda ligação materna com os filhos? Ou àquilo que falta ao homem e atrapalha sua sobrevivência, ao fato de demorar mais que as outras espécies para ter autonomia?
Mas, além disso, Kiriku e Macunaíma são duas obras muito divertidas, e que nem por isso são simples. Tendo se inspirado em tradições semelhantes, têm públicos muitos distintos.
Kiriku é daquele tipo de animação que, em vez que passar valores às crianças, incentiva a imaginação. E, quem sabe, após conhecer algo diferente de Shreks e Mulans, ela não se desenvolve com mais gosto pelos livros, por culturas diferentes da sua (e da americana). Para terminar, a música do filme (traduzida; em francês é mais bonita):
Kiriku não é grande mas é valente
Kiriku é pequeno mas é o meu amigo
Kiriku é pequeno mas é o meu amigo
Kiriku o valente, é melhor que nós
Kiriku não é grande mas é a nossa criança
Kiriku é pequeno mas tem bom coração
Kiriku é pequeno mas tem bom coração
Kiriku é pequeno mas é o nosso amigo
Kiriku não é grande mas é a nossa criança.
Mas, além disso, Kiriku e Macunaíma são duas obras muito divertidas, e que nem por isso são simples. Tendo se inspirado em tradições semelhantes, têm públicos muitos distintos.
Kiriku é daquele tipo de animação que, em vez que passar valores às crianças, incentiva a imaginação. E, quem sabe, após conhecer algo diferente de Shreks e Mulans, ela não se desenvolve com mais gosto pelos livros, por culturas diferentes da sua (e da americana). Para terminar, a música do filme (traduzida; em francês é mais bonita):
Kiriku não é grande mas é valente
Kiriku é pequeno mas é o meu amigo
Kiriku é pequeno mas é o meu amigo
Kiriku o valente, é melhor que nós
Kiriku não é grande mas é a nossa criança
Kiriku é pequeno mas tem bom coração
Kiriku é pequeno mas tem bom coração
Kiriku é pequeno mas é o nosso amigo
Kiriku não é grande mas é a nossa criança.
(Imagens: cartaz de Kiriku e a feiticeira e Grande Otelo como Macunaíma.)
Um comentário:
NOSSA BAIXINHA... FOI FUNDO MESMO HEIN!! VERY GOOD!!
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